Grupos que defendem a ampliação do acesso aos medicamentos manifestaram ontem apoio a uma eventual retaliação do governo brasileiro contra os EUA no setor de medicamentos. E reivindicaram que drogas contra a aids e o câncer devem estar entre as prioridades, caso o País realmente adote o mecanismo.
Pelo menos 18 medicamentos de alto custo usados no Sistema Único de Saúde poderiam entrar na retaliação, exemplificou uma das ONGs envolvidas no debate.A indústria farmacêutica de pesquisa (Interfarma), porém, divulgou nota na qual apela para que o Brasil busque outras soluções e anunciou eventuais prejuízos a investimentos no País, se a medida for adotada. Procurado, o Ministério da Saúde informou que não se manifestaria e ainda não tem uma lista de drogas que poderão ser abrangidas pela eventual retaliação.
De acordo com Renata Reis, especialista em patentes da ONG Abia (Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids), a retaliação poderia ocorrer, por exemplo, em drogas protegidas pelas chamadas patentes pipeline, alvo de ação de inconstitucionalidade que aguarda julgamento no Supremo Tribunal Federal. Trata-se de um dispositivo da lei de patentes nacional, de 1996, que reconheceu patentes obtidas no exterior e sem análise de requisitos previstos no marco legal nacional, como novidade e atividade inventiva.
O medicamento contra a aids Kaletra, da Abbott, é um exemplo. Chega a custar US$ 1.000 por paciente/ano. O genérico, que só pode ser fabricado ou importado se a patente cair, sairia a US$ 240, diz a ONG. Já a droga Gleevec, contra leucemia, cujo custo pode chegar hoje a US$ 30 mil por paciente/ano cairia para o nível de US$ 1.600 por paciente/ano.
Outra possibilidade, aponta a especialista, é o licenciamento compulsório de determinadas drogas, já adotado pelo governo Lula em 2007 no caso de um remédio contra a aids, o Efavirenz. Há ainda uma série de casos em que a indústria farmacêutica briga na Justiça para estender patentes, caso da que protege a droga Viagra, da Pfizer, contra disfunção erétil. A patente vence neste ano, mas a empresa tenta estendê-la até 2011 por via judicial, o que inviabiliza investimentos do setor de genéricos.
"Seria muito interessante que o governo atacasse o setor de remédios para ampliar acesso", diz Renata. "No Brasil, estima-se que cerca de 50 milhões de pessoas não têm acesso a medicamentos e 51,7% dos brasileiros abandonam o tratamento médico por falta de dinheiro para comprar as drogas."
Jorge Beloqui, especialista em acesso a medicamentos do Grupo de Incentivo à Vida, ressalva, porém, que o País já fez outras ameaças ao setor farmacêutico para garantir redução de preços de drogas e não tiveram resultado. Atualmente, porém, o Ministério da Justiça e o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) vinham revisando pedidos judiciais de extensão de patentes.
"O governo tem todo o direito de retaliar, mas os remédios não são alvo da disputa. Quebrar patentes não trará benefícios financeiros e sim uma insegurança enorme para investidores", afirmou Jorge Raimundo, presidente do conselho consultivo da Interfarma. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.
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